Era hora de me vestir de novo. Peguei cuecas novas, uma camisa novinha em folha, meias e calças. Coloquei então uma gravata e calcei sapatos novos. De pé diante do espelho, inclinei o chapéu sobre um olho e me examinei. A imagem no espelho parecia-me apenas vagamente familiar. Não gostei da gravata nova, por isso tirei o paletó e experimentei outra. Não gostei da mudança também. De repente, tudo começou a me irritar. O colarinho duro estava me estrangulando. Os sapatos apertavam meus pés. As calças cheiravam a porão de loja de roupas e estavam apertadas demais no gancho. O suor irrompia nas minhas têmporas, onde a fita do chapéu apertava-me o crânio. Subitamente comecei a me coçar e quando me mexia tudo estalava como um saco de papel. Minha narinas captaram a forte catinga das loções e fiz uma careta. Mãe do Céu, o que aconteceu ao velho Bandini, autor de O cachorrinho riu? Podia esse bufão amarrado e estrangulado ser o criador de As colinas distantes perdidas? Tirei tudo, expulsei com água os cheiros dos meus cabelos e me enfiei nas minhas velhas roupas. Elas ficaram muito contentes de me ter de volta; agarravam-se a mim com um deleite refrescante e meu pés atormentados se insinuaram para dentro dos velhos sapatos como na suavidade da grama da primavera.
Pergunte ao pó, de John Fante
março 27, 2009
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2 comentários:
já viu o filme?
veja depois e papeamos (põe na lista!).
bjo
Marcelo: não vi o filme. Me falaram tããããããão mal. Mas vou colocar na lista da locadora!
Beijos!
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