abril 03, 2006

Há quase um ano, desisti de chegar tarde em casa e batalhar por uma vaga no estacionamento coletivo do prédio. Resolvi ter meu próprio box. No posto da esquina. Box número 14. Mal sabia que um pouco menos de dinheiro no mês e um retângulo entre duas faixas amarelas poderiam render tantas histórias. Teve a noite em que o Ronaldo caiu em sono profundo. As buzinadas acordaram a vizinhança toda. Depois da meia-noite. E o cara não mexeu o dedinho. O taxista sugeriu que eu passasse pela fresta da grade. Não fui. Tremi o corpo inteiro só de pensar que, no lugar de um boné e um cabo de vassoura, eu podia encontrar mesmo o Ronaldo. Petrificado na cadeira. Tem a filha do dono da garagem. Eu não sei o nome dela. Mas, todos os dias, ela me abana como se fôssemos colegas de colégio. De uniforme e tudo. Tem o cafezinho carioca da loja de conveniência. Ótimo para as manhãs de "sono" desesperado. No entanto, nada, nada, nada supera a minha seqüência "OURO" de conversas surreais com o vigia oficial da noite. O Manuel.
- Aí, Manuel!
- Óóóóóóó!
- Tchau!
- Tchauuuuuuu!
Acho chato passar por ele e não falar nada. Sou uma menina querida. Então, vou passando e, enquanto ele segura o portão, vou falando. O diálogo é determinado pela velocidade dos passos.
- E esse tempo?
- Barbaridade!
- Amanhã chove.
- Bah! Não agüento mais...
É a meteorologia. É o "e aí?". Quando pensei que nada podia ficar mais realismo fantástico...
- Então é isso!
- Isso aí!!
- Vamos lá!
- A-hã!
Nem tenho saudades do elevador do prédio dos meus pais. Hey... Tenho um box. Só pra mim.

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